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Prevenção ao suicídio deve ser redobrada durante distanciamento social

Setembro amarelo

Prevenção ao suicídio deve ser redobrada durante distanciamento social

Saber identificar mudanças no comportamento é fundamental para evitar o auto-extermínio

O artigo “Suicide Mortality and Coronavirus Desease 2019 – a perfect storm?”, publicado no Journal of the American Medical Association – Psychiatry, avalia que a pandemia pode trazer um aumento do número de casos de auto-extermínio. O paper alerta que o isolamento social, o estresse econômico, a diminuição de atividades comunitárias e religiosas, e a dificuldade de acesso aos serviços de saúde mental podem piorar a situação dos casos de suicídio nos Estados Unidos, e que as ações de prevenção também devem ser prioridade de saúde pública. No Brasil, são quase 12 mil suicídios por ano e especialistas da área de saúde mental temem que o momento possa fazer com que esse número se eleve.

“O que a gente observa e a nossa preocupação em relação ao período da pandemia é que o confinamento trouxe, para algumas pessoas, diversas dificuldades”, avalia o psiquiatra, professor da Unifenas, colaborador e um dos autores do módulo de saúde mental do Núcleo de Educação em Saúde Coletiva da Faculdade de Medicina da UFMG (Nescon), Alexandre Pereira. “Primeiro, fico pensando naquelas pessoas que já tinham um transtorno psiquiátrico mais severo e, por conta da pandemia, ficaram sem atendimento à saúde ou estão com dificuldade de acessar o sistema de saúde”, pontua.

De acordo com o Ministério da Saúde, 96,8% dos suicídios no Brasil são de pessoas com algum transtorno mental. “Outro ponto seria o próprio efeito direto dos aspectos restritivos da pandemia, seja pela necessidade de isolamento social ou mesmo por perdas que a pessoa pode ter tido nesse período. Isso pode gerar mais sofrimento psíquico e, se eu estou trabalhando com uma população que já tem adoecimento mental, pode ser um impacto a mais”, completa.

Por isso, mesmo nesse momento, em que as relações estão sendo mais vivenciadas no mundo virtual, é preciso que se estabeleçam relações de diálogo e empatia com quem está por perto. “Eu acho que devemos ficar mais atentos uns aos outros, especialmente com quem estamos convivendo. Ter um pouco mais de paciência, tranquilidade, um pouco mais de equilíbrio na conversa com quem está mais próximo da gente. E ter uma atenção maior nas atitudes e nas falas que as pessoas podem desenvolver nesse período”, analisa o professor Alexandre. Ao perceber essas mudanças, é preciso conversar sobre o assunto. “Observando isso, a primeira coisa é tentar conversar com a pessoa, nos aproximarmos dela. Claro que num momento de mais tranqüilidade, em que a pessoa está com possibilidade de uma conversa frutífera, não deve ser num momento de briga. E perguntar mesmo o que está acontecendo, por que está diferente”, aconselha.

Mas o que observar?

A maior parte dos casos de tentativa ou de auto-extermínio são de quem já estava passando por grande sofrimento e, muitas vezes, já tinham um transtorno mental previamente identificado. Mas é preciso avaliar com sensibilidade. De acordo com o professor Alexandre, pessoas com ideação suicida apresentam certos padrões de mudança de comportamento conforme a faixa etária:

Crianças e adolescentes: O comportamento tende a ser mais de isolamento; de inibição às atividades que antes fazia anteriormente, como brincar ou interagir com outras pessoas. “De modo geral, crianças e adolescentes passam a mudar o comportamento e ficam mais isoladas, irritadas, reativas e hostis. Isso pode ser um sinal de alerta para a gente abordar essa criança e esse adolescente e entender o que está acontecendo”.

Adultos: Em geral, tendem a ficar mais reclusos, o humor pode ficar mais depressivo, com choro e expressão de angústia e sofrimento constantes e falas de cunho negativista como “acho que seria melhor não estar aqui”, “preferia estar morto” ou “não tenho mais planos para o futuro”. “Todas aquelas falas de cunho muito negativista e que tenham uma perda de perspectiva futura de um projeto pessoal ou alguma coisa que possa mobilizar a pessoa no presente podem ser falas as quais precisamos estar atentos”.

Idosos: A população idosa tem uma taxa de tentativa e de auto-extermínio mais alta que o restante da população, sendo um grupo de risco importante e que demanda mais cuidado e atenção. As alterações de comportamento mais comuns são isolamento, choro e tristeza. “O idoso fica mais queixoso da vida, muitas queixas somáticas e corporais – isso pode ser um indício de que está deprimido. Então, é importante uma aproximação para perguntar o que está acontecendo, o que está sentindo, se está tendo alguma ideia de desistir da vida. São elementos que são importantes a gente observar e ter essa tentativa de oferecer ajuda”.

Outros sinais da conduta suicida que podem ser identificados estão no desejo da pessoa de querer morrer ou se matar. “São coisas diferentes. No primeiro caso, a pessoa tem um sofrimento e quer sumir, desaparecer, dar um tempo, pela dificuldade do problema. No segundo caso, a pessoa está colocando um pensamento, talvez uma iniciativa, de que ela mesma vai acabar com esse sofrimento”, diferencia. Identificado o pensamento, é preciso saber se a pessoa tomou algum tipo de providência em relação à ideia de querer se matar. Seria um segundo estágio de risco. Por último, existe a situação de risco, que é quando a pessoa já tentou alguma coisa ou se está pensando em fazê-lo. Nesses casos, é preciso procurar uma emergência psiquiátrica ou uma urgência clínica para que o paciente possa ser avaliado.

Peça ajuda!

Em caso de comportamento suicida ou automutilação, acione o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), pelo número 192, ou procure atendimento de urgência hospitalar. Já o Centro de Valorização da Vida (CVV) oferece atendimento gratuito 24 por dia pela internet ou por telefone, no número 188. Em casos menos graves, acesse o site Mapa da saúde mental para encontrar uma lista de atendimento online e presencial, de forma gratuita ou a preços acessíveis, em todo o país.

Setembro amarelo

Entre 2011 e 2016, o Brasil perdeu quase 63 mil habitantes devido ao suicídio. Nesse mesmo período, mais de 48 mil atentaram contra a própria vida. Os dados são do Ministério da Saúde, divulgados em boletim de 2019. Os suicídios podem ser evitados, por isso, é o tema de série especial do Saúde com Ciência, que abre o mês dedicado à saúde mental.

 

Confira a programação:

:: Prevenção ao suicídio na pandemia
:: Reconhecendo riscos
:: Fatores de alerta
:: Como ajudar
:: Sobreviventes

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