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Assistente social do HC fala sobre os avanços e desafios do SUS

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Assistente social do HC fala sobre os avanços e desafios do SUS

Nesta terceira entrevista, promoção da saúde da população preta e parda é o tema

Nesta terceira e última entrevista com profissionais do Hospital das Clínica da UFPE com temáticas sobre saúde e população negra, conversamos com a assistente social da instituição Isadora Vitoriano. O assistente social, no âmbito da política de saúde, atua pela defesa dos direitos dos usuários e suas famílias, identificando os aspectos econômicos, políticos, culturais e sociais que interferem no processo de saúde-doença, intervindo para uma atenção de qualidade. Na entrevista, Isadora fala sobre os avanços e desafios do SUS na promoção da saúde e cuidado da população negra e como podemos avançar no tema. “São vários estudos que evidenciam as inequidades em saúde decorrentes da raça/cor da população e somos nós, profissionais da saúde, que perpetuamos o racismo institucional, estejamos consciente disso ou não. Sem uma busca efetiva em desconstruir esse imaginário social, através de uma educação permanente, dificilmente conseguiremos construir uma prática profissional antirracista e cumprir os princípios do SUS”, afirmou Isadora. Confira a entrevista completa:

Quais os principais avanços do SUS na promoção e acesso à saúde da população negra?
Acredito que o principal avanço é a existência dos marcos legais que visam enfrentar o racismo na sociedade brasileira, e destaco a existência do Estatuto da Igualdade Racial e da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra.

Não podemos esquecer que a história do nosso país é marcada por um longo período de escravização do povo negro e que essas pessoas eram tratadas como mercadoria, desumanizadas, e que simplesmente a abolição da escravidão não fez desaparecer essa forma como a população negra era vista/tratada.
Isso quer dizer que o racismo estrutura a nossa sociabilidade na qual quanto mais negra é a pele mais situações de violências e opressão a pessoa vivência. Isso significa dizer também que nascer com a pele branca já nos coloca numa posição de privilégio.

Portanto, a existência de uma Política de saúde específica voltada para a população negra é reconhecer que a raça é um marcador de desigualdade social que gera inequidades em saúde e que precisamos ter ações específicas para essa população.

No estado de Pernambuco, temos na Secretaria de Saúde uma Coordenação de Atenção à Saúde da População Negra, fruto da diretriz da Política Nacional que estimula estados e municípios a desenvolver ações nos seus níveis de gestão.


Quais são os principais desafios na atualidade em relação ao papel do SUS na promoção da saúde e cuidado da população negra? 
Os desafios são muitos. Partindo de um conceito ampliado de saúde, entendemos que a saúde não é apenas ausência de doença, mas é condicionada por determinações sociais, econômicas e culturais. Nesse sentido, o cenário atual do nosso país, de crise econômica, agravada pela pandemia, evidencia um aumento da desigualdade social e da concentração de renda, em que pessoas brancas, em sua maioria, mantêm seus privilégios, enquanto o empobrecimento, aumento do desemprego, dentre outras questões, vão afetar principalmente pessoas negras. A precarização das condições de vida rebate diretamente na saúde de maneira geral e na saúde mental das pessoas.

O desmonte também do controle social no SUS com a extinção de comitês e fóruns de participação social torna mais difícil a construção das especificidades da Política de Saúde da População Negra.

Outro grande desafio diz respeito aos aspectos culturais do racismo estrutural que nos serviços de saúde se expressa no racismo institucional. Essa forma de racismo nem sempre ocorre de maneira direta e clara, com falas ou xingamentos, mas sobretudo na forma de acolhimento e tratamento no serviço de saúde em que pessoas brancas, em geral, são acolhidas no seu sofrimento e a população negra, muitas vezes, é negligenciada nas suas necessidades. 

Como modificar esse panorama? 
A gente não pode achar que sem defender o SUS como uma política pública universal estatal e de qualidade, a gente pode enfrentar as inequidades em saúde provocadas pelo racismo que afetam principalmente a população negra. Sem o SUS e a estruturação dos seus serviços, acabamos por manter estabelecido que a população branca é quem terá acesso prioritário à saúde, já que são a maioria dos que podem pagar por serviços de saúde. 

Outro ponto importante é perceber e desnaturalizar o racismo presente no nosso cotidiano. Isso exige de nós, profissionais de saúde, reconhecermos as desvantagens que pessoas negras vivenciam e as vantagens das pessoas brancas e que isso reflete na nossa prática profissional e de como acolhemos as pessoas no nosso serviço de saúde. É reconhecer as associações que povoam o nosso imaginário social em que negro é sinônimo de algo depreciativo/ruim/feio/perigoso enquanto o branco é positivo/belo/superior e que isso reflete na escuta que realizamos às pessoas em suas queixas de saúde, em sua capacidade de seguir determinado tratamento, etc.

São vários estudos que evidenciam as inequidades em saúde decorrentes da raça/cor da população e somos nós, profissionais da saúde, que perpetuamos o racismo institucional, estejamos consciente disso ou não. Sem uma busca efetiva em desconstruir esse imaginário social, através de uma educação permanente, dificilmente conseguiremos construir uma prática profissional antirracista e cumprir os princípios do SUS.